As Diferidas são uma série de fotografias de viagem, de estrada, de lugares de passagem e de rápida paragem. Estas imagens foram feitas através do mecanismo Google Street View, a câmara fotográfica de rua de continuidade, que a Google usa nos seu serviço de Mapas. Depois da sua captura, seguiu-se um processo de pós produção que as tentou afastar da visualidade de impressão de ecrã de computador. Numa primeira vista, o exercício não é incomum. Em Oh Shit! More 365 Days Whithout Any Sign of Another Attack on Global Capitalism, Fernando José Pereira para criar um registo de 365 imagens diferidas do vulcão Eyjafjallajökull, na Islândia serve-se de uma webcam instalada nas proximidades do lugar. Thirtyfour Parking Lots, de Hermann Zschiegner (2006), e The Nine Eyes of Google Street View, de Jon Rafman (2009), utilizam as ferramentas Google Earth e Google Street View para, respectivamente, refotgrafar o livro homónimo de Edward Rushka, de 1967, e capturar, de certa forma, o pitoresco, o estranho e o bizarro que este sistema potencia. Em ambos os casos, um processo de procura e de investigação serve de ponto de partida ao trabalho. Porém, As Diferidas partem de outro pressuposto e propõem outra camada de leitura: qualquer destas imagens poderia ter sido feita in loco, obedecendo a uma lógica formal da presença do fotógrafo no local da fotografia. É que, de facto, o fotógrafo esteve lá, passou por ali um dia, memorizou o lugar como fotografável. Apenas não o fotografou nessa passagem. As premissas do acto fotográfico estão, por isso, presentes neste trabalho, mas não necessariamente na sua ordem ou continuidade habitual. O fotógrafo esteve lá (presença) quis registar (intenção), fotografou (registo) e criou uma imagem (produção). Aqui chegados, as questões levantam-se: estaremos ainda a falar de fotografia, de autoria? Estaremos já no campo da apropriação? Ultrapassando, pela sua natureza mediata, um registo de viagens feitas entre 1997 e 2013, As Diferidas lidam com a memória do lugar, com a sua transformação - afinal, o que fazem estas imagens à memória que temos dos lugares? - e com uma nova noção de regresso, simulável, ficcionável, feito em casa: o acto fotográfico é agora feito na leitura de uma imagem fotográfica. Imagens acima feitas a partir de Google Street View. As Diferidas: memória, autoria, fotografia. foram apresentadas no Espaço Mira, Porto, Sábado, 8 de Fevereiro de 2014. |